Advogada explica os riscos para companhias que permitem trabalho remoto sem a formalização de políticas
Thais Aline Cerioni
Publicada em 17 de outubro de 2008 às 20h43
Muitas empresas já começaram e outras tantas estão planejando adotar políticas de trabalho remoto para seus funcionários. Os benefícios são muitos, entre os quais destaca-se o aumento da produtividade e a melhor qualidade de vida da equipe.No entanto, existem questões legais envolvidas – especialmente no que diz respeito às leis trabalhistas e ao vazamento de informações confidenciais – que devem ser levadas em conta antes de as empresas tomarem essa decisão. Conversamos com a advogada especialista em direito digital Patricia Peck sobre o tema. Leia, abaixo, quais as melhores práticas antes de implementar políticas de trabalho remoto em sua empresa.
CIO – Como as empresas podem se proteger dos riscos ligados ao trabalho remoto, sem abrir mão de seus benefícios?
Patricia Peck - A empresa deve elaborar uma política clara sobre uso de home office (que pode ser mais ampla e tratar também de assuntos como VPN (virtual private networks) e smartphone, que são outros formatos de trabalho remoto). É recomendável a assinatura de um termo de responsabilidade e deve ficar descrito que o ambiente está sujeito a monitoramento e inspeção, e inclusive, definir situação de cargo de confiança e diferenciar o que é mero acesso, do que seria jornada de trabalho estendida. A tendência atual é o mobile office (uma evolução do próprio home office, na qual o executivo está em qualquer lugar, no trabalho, em casa, no aeroporto, no hotel, etc.). Com isso, criamos situações do funcionário 24 horas online, o que se não ficar muito bem normatizado, gera grandes riscos legais e de incidentes de vazamento de informação confidencial por estas funcionalidades.
CIO - Como a empresa deve se posicionar para agir da forma mais correta (sem prejudicar funcionários e nem deixar brechas para cobranças indevidas)?
Patricia Peck - Esta é uma questão interessante. Depende do cargo do funcionário. Por isso, a empresa precisa alinhar a política de concessão de recursos de mobilidade com alçadas e poderes. Se for cargo de confiança não seria uma extensão de jornada. No entanto, nas áreas de TI, é comum que toda a equipe esteja conectada. Aí sim, pode haver este entendimento, a não ser que haja um procedimento padrão de solicitação de trabalho, como se fosse uma abertura de chamado. Logo, a empresa precisa dizer como é que deve ser feito para formalizar a hora extra ou a jornada estendida. Se não disser nada, fica sujeita ao que o juiz entender do caso. As empresas não fizeram ainda esta arrumação de casa e correm grandes riscos, com o problema de não saber nem qual é o tamanho da conta. Se formalizar, pelo menos consegue gerir melhor e aplicar os princípios de governança em TI. Não formalizar é o mesmo que não ter controle e não saber o risco, e isso, em uma grande empresa, é inaceitável.
CIO - Equipes globais precisam trabalhar em horários “alternativos” devido ao fuso. No entanto, departamentos de RH costumam ser contrários à flexibilidade de horário devido a questões trabalhistas. Como adequar as políticas de RH à realidade global de muitas equipes?
Patricia Peck - Hoje já existe trabalho por turnos pré-estabelecidos. O problema é ficar mudando este horário. Uma coisa é a pessoa ser do turno da noite, outra coisa é não ter horário definido. De fato, é um novo modelo de trabalho mais complexo. O livro “O Mundo é Plano”, do Thomas L. Friedman, trata muito bem disso. Precisamos amadurecer o modelo de contratação no Brasil. O RH deve sim revisar o modelo atual, inclusive, para criar cultura de uso ético, seguro e legal das ferramentas de trabalho tecnológicas. É essencial revisar o Código de Conduta do Colaborador, além de também criar o Código de Conduta do Terceirizado, pois além da mobilidade, cresce o uso de mão de obra terceirizada. Devemos destacar que o uso destes recursos, de forma não adequada, gera não apenas riscos para a empresa (especialmente de segurança da informação), como riscos para a saúde do funcionário (que não consegue se desconectar). Além disso, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deveria ser atualizada para atender a esta nova realidade. Vemos que a CLT hoje não responde a estas lacunas, e não podemos mais ignorar esta atual realidade conectada.
Dra Patricia Peck Pinheiro, advogada especialista em direito digital, é sócia da Patricia Peck Pinheiro Advogados e autora do livro “Direito Digital” pela Editora Saraiva. Pode ser contactada no email patriciapeck@pppadvogados.com.br
Thais Aline Cerioni
Publicada em 17 de outubro de 2008 às 20h43
Muitas empresas já começaram e outras tantas estão planejando adotar políticas de trabalho remoto para seus funcionários. Os benefícios são muitos, entre os quais destaca-se o aumento da produtividade e a melhor qualidade de vida da equipe.No entanto, existem questões legais envolvidas – especialmente no que diz respeito às leis trabalhistas e ao vazamento de informações confidenciais – que devem ser levadas em conta antes de as empresas tomarem essa decisão. Conversamos com a advogada especialista em direito digital Patricia Peck sobre o tema. Leia, abaixo, quais as melhores práticas antes de implementar políticas de trabalho remoto em sua empresa.
CIO – Como as empresas podem se proteger dos riscos ligados ao trabalho remoto, sem abrir mão de seus benefícios?
Patricia Peck - A empresa deve elaborar uma política clara sobre uso de home office (que pode ser mais ampla e tratar também de assuntos como VPN (virtual private networks) e smartphone, que são outros formatos de trabalho remoto). É recomendável a assinatura de um termo de responsabilidade e deve ficar descrito que o ambiente está sujeito a monitoramento e inspeção, e inclusive, definir situação de cargo de confiança e diferenciar o que é mero acesso, do que seria jornada de trabalho estendida. A tendência atual é o mobile office (uma evolução do próprio home office, na qual o executivo está em qualquer lugar, no trabalho, em casa, no aeroporto, no hotel, etc.). Com isso, criamos situações do funcionário 24 horas online, o que se não ficar muito bem normatizado, gera grandes riscos legais e de incidentes de vazamento de informação confidencial por estas funcionalidades.
CIO - Como a empresa deve se posicionar para agir da forma mais correta (sem prejudicar funcionários e nem deixar brechas para cobranças indevidas)?
Patricia Peck - Esta é uma questão interessante. Depende do cargo do funcionário. Por isso, a empresa precisa alinhar a política de concessão de recursos de mobilidade com alçadas e poderes. Se for cargo de confiança não seria uma extensão de jornada. No entanto, nas áreas de TI, é comum que toda a equipe esteja conectada. Aí sim, pode haver este entendimento, a não ser que haja um procedimento padrão de solicitação de trabalho, como se fosse uma abertura de chamado. Logo, a empresa precisa dizer como é que deve ser feito para formalizar a hora extra ou a jornada estendida. Se não disser nada, fica sujeita ao que o juiz entender do caso. As empresas não fizeram ainda esta arrumação de casa e correm grandes riscos, com o problema de não saber nem qual é o tamanho da conta. Se formalizar, pelo menos consegue gerir melhor e aplicar os princípios de governança em TI. Não formalizar é o mesmo que não ter controle e não saber o risco, e isso, em uma grande empresa, é inaceitável.
CIO - Equipes globais precisam trabalhar em horários “alternativos” devido ao fuso. No entanto, departamentos de RH costumam ser contrários à flexibilidade de horário devido a questões trabalhistas. Como adequar as políticas de RH à realidade global de muitas equipes?
Patricia Peck - Hoje já existe trabalho por turnos pré-estabelecidos. O problema é ficar mudando este horário. Uma coisa é a pessoa ser do turno da noite, outra coisa é não ter horário definido. De fato, é um novo modelo de trabalho mais complexo. O livro “O Mundo é Plano”, do Thomas L. Friedman, trata muito bem disso. Precisamos amadurecer o modelo de contratação no Brasil. O RH deve sim revisar o modelo atual, inclusive, para criar cultura de uso ético, seguro e legal das ferramentas de trabalho tecnológicas. É essencial revisar o Código de Conduta do Colaborador, além de também criar o Código de Conduta do Terceirizado, pois além da mobilidade, cresce o uso de mão de obra terceirizada. Devemos destacar que o uso destes recursos, de forma não adequada, gera não apenas riscos para a empresa (especialmente de segurança da informação), como riscos para a saúde do funcionário (que não consegue se desconectar). Além disso, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deveria ser atualizada para atender a esta nova realidade. Vemos que a CLT hoje não responde a estas lacunas, e não podemos mais ignorar esta atual realidade conectada.
Dra Patricia Peck Pinheiro, advogada especialista em direito digital, é sócia da Patricia Peck Pinheiro Advogados e autora do livro “Direito Digital” pela Editora Saraiva. Pode ser contactada no email patriciapeck@pppadvogados.com.br
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